O fundo que nos une: por uma intersubjetividade social em Vilém Flusser

Abstract

À partir da hipótese de Vilém Flusser de que vivemos sob um modelo de sociedade que “achata” e encurta” nossa percepção e relação com nosso ecossistema e que vai nos direcionando rumo a uma “miopia social” (nosso termo) ou uma “dissociação do ambiente” questão que sabemos ser central para o autor, partimos do curso “Filosofia e Evolução das Ciências”, ministrado por ele na Politécnica da USP em 1959, quando questiona e critica a maneira como a ciência ocidental moderna se originou e o Humanismo decorrente; fica claro perceber como suas ideias para uma “teoria do conhecimento” demonstradas ali, se mostravam profundamente relevantes e já sinalizadoras para os sintomas apresentados nas correspondências dos anos 70 e 80 (Rodolfo Geiser; Gabriel Borba e Milton Vargas) e, que parece se concretizar de forma plena nos anos 20 do século XXI. Para deixar documentado, em 2019 vivemos e seguimos vivendo uma catástrofe sanitária e fascista de gigantescas proporções e que nos parece claramente decorrente dessa “miopia” ou da falta de compreensão desse “fundo comum de humanidade” (Viveiros de Castro, 2010, p. 20) no qual estamos inseridos junto aos “outros”. A pergunta que o autor propõe, “como incorporar o outro, e como ser incorporado pelo outro, sem que se perca a diferença na identidade?”, provém da Antropofagia de Oswald de Andrade e está presente em seu artigo “Ame o teu outro como a ti próprio” (Flusser, 1982, p.1) precisa ser respondida, e com ela um esclarecimento do que são gestos, modelos, objetos, coisas, outro, pessoas, diálogos, relações. Para Flusser, o gesto que acompanha o modelo da civilização ocidental é o do homo Faber – gesto de informar e engajar (outros, coisas e não coisas): “é um gesto discursivo, emissor para receptor pelo canal da mediação” (Sd-2, cad. 3, p. 67) e o desafio é como não transformar o “receptor/emissor” em objeto ou aparelho ou fetiche. Destacamos aqui a abordagem ecológica flusseriana – sua pedagogia da intersubjetividade (Dabdab & Baitello) - como um caminho democrático e responsável para a compreensão da nossa realidade e construção de uma intersubjetividade social. E pontualmente relacionar os conceitos de Intersubjetividade e Religiosidade de Flusser com os conceitos de Perspectivismo, Multinaturalismo e Humanidade presentes na cultura ameríndia e propostos como uma filosofia por Viveiros de Castro.